Hora Marcada.

Acordei suando. De novo. Mas uma vez, eu sonhei com aquele garoto.
É estranho. Ele está sempre na mesma posição. Olhando pra mim como se esperasse alguma coisa. Uma das mãos ficava no bolso. Não a tirava nunca.
Eu corria desesperadamente atrás dele, mas nunca o alcançava. Não avançava e nem retornava, era como se eu corresse numa esteira imaginária. Por mais que eu tentasse, não conseguia sair do lugar. Então ele sumia e eu acordava, sempre ás 9 horas e 44 minutos.
Mas não deveria ser nada, muitas pessoas costumam ter os mesmos sonhos sem sentido. Voltei a dormir e só acordei de manhã. Como de costume me arrumei e fui pra escola. A pé, claro. Eu sempre vou por dentro, porque chega mais rápido. Mas nesse dia eu quis ir pela praia. Apesar de demorar um pouco mais que o meu caminho de rotina, eu estava sem pressa de chegar na escola. Então eu fui. Passei pelo quiosque da tia Cida, pelos barcos do seu Valdir e pela rua da subida, que sempre me chamou atenção. Não a subida em si, mas porque era a única rua diferente das outras. Sempre tive curiosidade de saber o que tinha lá em cima, e hoje eu queria descobrir. Iria matar aula, mais e daí? Acendi meu cigarro e comecei a subir. O caminho olhando lá de baixo parecia seguro, mas depois foi tomando mais a característica de uma trilha. Pensei em voltar, mas decidi avançar. Minha curiosidade falou mais alto. A trilha começou a ficar mais fechada, mas eu continuei. Comecei a ouvir um som, um tipo de música. Ela vinha de um lugar que se destacava do restante da floresta que a trilha tinha me metido. No meio tinha troncos de árvores que pareciam servi de banco. Passei os olhos em tudo e nada me despertou lembrança alguma. Até que eu vi quem estava sentado em um dos troncos. Era ele. O garoto que me acordava todas as noites. Branquinho, o rosto perfeito, e cabelos pretos. Tinha lindos olhos negros que pareciam penetrar em mim e exibia um sorriso tímido.
- oi. - disse, tímido. - deve me reconhecer de algum lugar. Sou Miguel. Eu não conseguia acreditar. O garoto dos meus sonhos, parado na minha frente. Fiquei paralisada. Sentia dentro de mim um aperto forte no coração. Sentia-me feliz acima de tudo. Como se esperasse por aquele momento a minha vida toda. Olhei para baixo, tímida. Vi meu relógio.
9 horas e 44 minutos.
O susto foi tão grande que eu dei um pulo pra trás. Percebi que ele tinha sumido.
No seu lugar apenas uma lápide no chão. Cheguei mais perto, gelada de medo.
E li os dizeres que eu mais temia. “Miguel, 15 anos. Descanse em paz.”
Desmaiei.

Acordei no meu quarto. era outro dia, de manhã. Logo pensei que era tudo um sonho. Outro sonho estranho e sem sentido algum.
Na escola, sentei-me na classe, quieta.
- temos um novo aluno. - disse a professora.
- porque não diz o seu nome?
- Miguel. - ele disse, com uma mão no bolso.

Por Carina Fonseca.

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